Quando os alunos perguntaram ao Mestre qual era o seu segredo, ele respondeu:
“Quando estou sentado, estou sentado. Quando estou em pé, estou em pé. Quando estou caminhando, estou caminhando.”
Os alunos se entreolharam perplexos e acharam que não tinham entendido direito. Então resolveram fazer novamente a pergunta: “Mestre, qual é o segredo de sua sabedoria?” E ele disse:
“Quando estou sentado, estou sentado; quando estou em pé, estou em pé; quando estou caminhando, estou caminhando.”
Os alunos ficaram impacientes e retrucaram: “Mestre, o que o senhor está dizendo nós também fazemos, mas estamos muito longe da sua sabedoria”. O Mestre sorriu e disse: “Não. Quando vocês estão sentados, já se levantaram. Quando vocês estão em pé, já partiram. Quando estão caminhando, já chegaram.”
Esta história foi escrita por Willigis Jager (2009) e citada no artigo “Concepções de subjetividade em Rogers, Freud e Gendlin: psicoterapia humanista-fenomenológico-existencial e sabedoria oriental” (2014) do professor Walter Andrade Parreira. Os alunos do mestre andavam o tempo todo preocupados com o futuro e nunca entravam em contato com o que estavam vivendo naquele instante. Estavam sempre no depois, no que ainda estava por vir. Sempre preocupados.
A palavra preocupação (pré-ocupação) indica estar previamente ocupado com alguma coisa. Uma ocupação prévia. Quando uma pessoa está bastante pré-ocupada com o passado ou com o futuro, ela se distrai tanto nessa pré-ocupação que não fica presente ao que está sendo vivido agora por ela. Ela perde o fluxo do presente que está ocorrendo agora.
Se estou pré-ocupado com o depois, não há espaço pra ficar com o que ocorre em mim agora. Eu perco o presente. Consequentemente, eu me perco. É um grande paradoxo, pois, além do presente qual outro momento nós temos para fazer algo? Até mesmo pra pensar no passado ou no futuro, só posso fazer isso agora, no presente.
E quantas vezes no nosso cotidiano fazemos exatamente a mesma coisa que os alunos do mestre? Almoçamos com a cabeça no compromisso que teremos depois do almoço e nem saboreamos direito a comida. Haverá um acontecimento na semana que vem e já estamos pré-ocupados e imaginando como será.
Ou nos deitamos para dormir sem de fato descansar e curtir o prazer do descanso, pois a cabeça está nos problemas, preocupações, o dia seguinte, etc. Estamos indo para algum lugar e já pensando em quando voltaremos. Viajamos um final de semana querendo desligar um pouco do trabalho, mas viajamos pré-ocupados com ele.
A história do Mestre e seus alunos mostra que para a sabedoria oriental é fundamental ficarmos conscientes de nós mesmos e do que estamos vivendo aqui e agora, nesse exato instante. Assim, a preocupação excessiva com o futuro geralmente é vista como um sintoma que ocorre em pessoas que apresentam quadros de ansiedade. É muito comum ver pessoas ansiosas se pré-ocupando muito com o futuro, de forma que ansiedade e preocupação caminham juntas.
Mas esse dilema não é exclusividade dessas pessoas: ele vai muito além de um sintoma de ansiedade. Afinal, diz respeito ao modo como eu me relaciono com a minha própria experiência e com a incerteza do futuro, com o que ainda não aconteceu. O que está em jogo aí é como eu olho para mim mesmo e para o desconhecido que se apresenta, do qual não possuo nenhuma garantia ou certeza. É como eu lido com as possibilidades que me constituem.
Se nos projetamos sempre no depois, nos distanciamos de nós mesmos e de tudo que estamos vivendo nesse instante, que é quando tudo acontece. Se ansiedade e preocupação contribuem para esse distanciamento, não posso ter consciência de mim mesmo e assim não me reconheço. Não posso ter contato comigo mesmo.
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